O documentário Fake Famous, disponível na HBO Max, parte de uma pergunta instigante: será que é possível fabricar um influenciador de sucesso? A resposta é mais complexa do que parece e, apesar das boas intenções do experimento, o método perdeu relevância em questões essenciais.
Vem comigo que eu vou te contar por que Fake Famous merece ser assistido, mas como seu impacto poderia ter sido muito maior se a HBO usasse seu orçamento e hipótese de outra forma. E, claro, vou trazer reflexões sobre influenciadores, saúde mental e o papel da autenticidade nesse mundo de algoritmos.
Mas, primeiramente, vamos ao trailer do filme:
O experimento: transformar anônimos em influencers
A premissa do documentário é simples: três pessoas anônimas, com poucos seguidores no Instagram, foram selecionadas para se tornarem influencers por meio de uma estratégia coordenada.
Os participantes escolhidos foram:
- Dominique Druckman: mulher branca, magra, loira, atriz e vendedora de loja;
- Wylie Heiner: homem branco, gay, loiro, assistente de um corretor de imóveis;
- Chris Bailey: homem negro, com tranças nagô, multiartista e empreendedor

Logo de cara, o documentário mostra o quanto os números (falsos ou não) mudam tudo. Dominique, por exemplo, começa a ser chamada para testes e recebe atenção do mercado só por causa de seu novo status de “famosa”. Mas será que isso foi só por conta do número de seguidores?
Spoiler: não. E é aí que começa a dar ruim no documentário
Existe vida além dos bots
A produção do documentário gastou uma energia enorme na compra de seguidores e engajamento fake. Sim, eles também investiram em ensaios fotográficos encenados, mas a grande aposta foi a compra de seguidores e curtidas. O problema é que em pleno 2021 — e hoje ainda mais — , isso não é surpreendente. O mercado publicitário já sabe que esse tipo de estratégia não se sustenta, afinal se cria um abismo entre o número de seguidores e o engajemento genuíno em caso de postagens patrocinadas.
O documentário Fake Famous poderia ter ido além desse truque comercial investido mais em interação real, estratégia de conteúdo ou até mesmo explorado as potencialidades individuais de cada participante, mas em vez disso, optou pelo atalho mais mais batido. E esse atalho se chama Dominique.
Dominique: a ‘massinha’ perfeita
Um dos momentos mais incômodos (e reveladores) do documentário é quando o participante Chris comenta que Dominique era como “uma massinha”, facilmente moldável para os padrões que o Instagram valoriza. Dominique passa por transformações visuais, muda a forma de falar e se comportar até se tornar a influencer perfeita para a meta do experimento.
Para além do interesse pessoal de Dominque em fazer o que fosse necessário para se tornar famosa, esse gesto deixou explícito como o ‘sucesso’ de alguém no mercado digital ainda é determinado pela aparência física. Ao se apresentar como uma mulher branca, magra, loira e simpática, Dominique rapidamente se enquadra no nicho de influencers de lifestyle ao passo em que deixa parte da sua autenticidade de lado para agradar o público.
Aliás, será que estamos mais propensos a seguir alguém quando vemos que o perfil já tem milhares (ou milhões) de seguidores? A cultura dos bots indica que sim.
Chris e Wylie: os esquecidos no churrasco
Chris e Wylie não se adaptaram ao plano ou o plano não foi adaptado para eles? Ambos os rapazes sentiram a pressão psicológica do experimento ao precisarem fingir terem outra personalidade, e além disso questionaram a compra de bots como principal estratégia para crescerem como influencers. É uma pena que a produção não tenha desenhado uma estratégia para que Wylie e Chris pudessem produzir conteúdo dentro dos seus interesses e talentos, incluindo os recortes de gênero e sexualidade. Sim, nós temos as clássicas blogueiras de lifestyle, mas também temos influencers masculinos na área musical, no humor, no lifestyle/moda…
Mas a produção pareceu despreparada e, principalmente, desinteressada a lidar com esses caminhos alternativos. Faltou escuta e planejamento para que o Chris focasse nos nichos do esporte, arte e lifestyle, por exemplo. Enquanto isso, o Wylie poderia se conectar com marcas de aventura e natureza. Porém ninguém se esforçou para aprimorar o caso deles enquanto a Dominique viralizava dentro do ‘plano A’.
Um pouquinho mais de vida real
Outro ponto que deixa a desejar: cadê as interações com pessoas de verdade? O momento mais promissor do experimento foi a viagem da Dominique junto a várias outras influencers rumo a uma convenção de beleza. Foi um choque cultural que poderia ser mais aproveitado, mas mesmo assim as cenas rendem ótimas reflexões sobre o comportamento de blogueiras fora da internet.
Seria incrível se a produção tivesse levado os três participantes para experiências mais imersivas, como encontros com marcas, networking, ou até colocar eles cara a cara com outros influencers.
No fim das contas, Fake Famous não é só sobre a fama (fútil) que influenciadores podem ter. É sobre como nós nos comportamos enquanto indivíduos, sociedade e até indústria. Inclusive, convido vocês a ouvirem o episódio ‘O Fantástico Mundo dos Mimos’ do podcast Influência Negra, lá nos traçamos a diferença entre “recebidos” e publicidade paga pra falar um pouco sobre como a creator economy funciona.
E você, já tinha assistido Fake Famous? Caso ainda não tenha feito isso, corra pra HBO Max e tire suas próprias conclusões. E se quiser continuar refletindo sobre fenômenos da comunicação, recomendo que você se inscreva no meu canal no YouTube. Olha só esse vídeo sobre a onda dos podcasts de entrevista:
Nos vemos nas redes! Me acompanhe no Instagram, LinkedIn, TikTok e YouTube como @nathbragap.